Por Ramon Morays
"Gentê"!!! faz quase um ano que li um texto do agora Dep. Fed. Jean Wyllys, antes escritor e jornalista, apesar que nesse ramo ele ainda continua. mais a vida dele pouco me importa, digo de passagem que a vida é algo pessoa, inclusive o cuidado que cada um tem com ela - refiro-me ao dono - então, segue abaixo o texto do grande Jean:A melhor lição de avatar
Avatar  não é só um porque diversões nem apenas entretenimento sem culpa para  platéias pouco exigentes. O mundo representado no novo filme de James Cameron  não está tão além de nossa imaginação como alguns afirmam. Existem  povos e pessoas que mantêm, com a natureza, relação semelhante à do povo  Na’vi (os humanóides habitantes do planeta Pandora). Os indígenas e os  adeptos do candomblé são alguns desses povos e pessoas. Por ignorância  ou falta de repertório cultural, a grande maioria dos milhões de  brasileiros que têm ido ao cinema assistirem ao filme não consegue fazer  tal comparação. Por isso mesmo, é importante que ela seja feita aqui e  agora e que seja explorada ao máximo por professores dos ensinos  fundamental e médio, sobretudo neste momento delicado em que terreiros  de candomblé de Salvador vêm sendo atacados por criminosos e/ou  “demonizados” por cristãos fundamentalistas e por uma mídia igualmente  ignorante (aliás, em Avatar, o povo Na’vi é também atacado e vítima de preconceitos e tem seu “terreiro” destruído por armas e ferramentas). 
  Para  os adeptos do candomblé, a natureza é viva e, dela, fazemos parte; a  ela, estamos conectados profundamente. Identificar os orixás (ou  inquices ou voduns ou, como quer o sincretismo religioso, santos) de uma  pessoa é reconhecer as forças da natureza às quais ela está conectada;  os elementos da natureza e da vida cotidiana que constituem seu axé, a força sagrada da vida. Exu são os caminhos e o movimento, o sangue e sêmen; Iemanjá são os mares, calmos ou bravios; Iansã são os ventos fortes e os raios, mas, também a brisa leve; Ogum é a guerra e é a paz; Omolu é a doença e a cura; Oxum é a água doce e a fertilidade; Oxóssi são as matas; e por aí vai...
  Desespero  semelhante ao do povo Na’vi diante da derrubada grande árvore pode ser  visto em terreiros cuja gameleira de fundação morre ou tomba. A ialorixá  ou babalorixá e seus filhos choram a morte da árvore que representa o  tempo, o tempo do próprio terreiro. A cena em que uma na’vi ensina o  avatar a sacrificar o animal que servirá de alimento de forma “limpa”,  quase indolor, representa bem a maneira como animais são sacrificados em  rituais do candomblé. Ao contrário do que os ignorantes e  preconceituosos propagam, não há crueldade em nenhum dos sacrifícios  rituais do candomblé realizados com animais. A razão do ritual é  alimentar a família do terreiro, inclusive os pais e as mães ancestrais  que estão na origem de tudo, os orixás. E o povo de terreiro, assim como  o Na’vi, sabe agradecer à natureza pelo alimento que lhe matem vivo; ao  contrário daqueles hipócritas que, embora condenem o candomblé pelo  sacrifício ritual, consomem diariamente quilos de carne animal sem se  perguntar sobre os métodos utilizados para o abate de bois, carneiros,  bodes, aves e peixes; certamente não deve haver qualquer cuidado.
  E  já que o assunto é sacrifício ritual, que fique claro de uma vez por  todas que nunca houve e não há em nenhuma das chamadas “religiões de  matriz africana” ritual envolvendo sacrifício de vida humana, seja qual  for sua faixa etária. Portanto, a imprensa tem a obrigação de não  associar o estarrecedor episódio das agulhas enfiadas no menino ao  candomblé ou a qualquer outra religião de matriz africana. Os rituais do  candomblé não têm nada a ver com aquele crime ou com qualquer outro! Os  rituais são apenas meio de reverenciar a natureza e de solicitar sua  ajuda, assim como o é aquele ritual Na’vi para devolver a vida à  pesquisadora interpretada por Sigourney Weaver. O candomblé não sacrifica vida humana, principalmente a vida de um erê.  E ainda que a acusada de enfiar as agulhas na criança afirme ser  “mãe-de-santo”, não se pode condenar o candomblé como um todo, pois,  quando um médico ou um pastor ou um padre comete crimes a imprensa não  condena toda medicina nem todo cristianismo.
  Os modos de vida do povo Na’vi não são, portanto, frutos da imaginação criativa de James Cameron.  O diretor certamente se inspirou em tratados antropológicos sobre povos  que têm a natureza como algo sagrado; como uma “Grande mãe”; e, entre  esses povos, estão os nossos indígenas e o povo de terreiro. Assim, aos  que poluem, desmatam, profanam terreiros ou demonizam os orixás, eu  deixo a melhor lição de Avatar: o que natureza deseja sempre é  manter seu equilíbrio, mesmo que, para tanto, ceife algumas vidas; a  gente fala, mas, a última palavra é dela!
 
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